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Faltou maca, cadeira, cama e espaço no hospital Nossa Senhora da
Conceição, em Iati (Sertão), semanas atrás. Os funcionários tiveram que
atender um número inédito de doentes, quase todos com forte diarreia.
Acostumados a cuidar de cerca de 40 pacientes com DDA por mês, eles
receberam 571. Segundo Kelyton Costa, do Departamento de Vigilância em
Saúde, a água que abastece Iati vem de dois reservatórios, um em Saloá e
outro em Paranatama. De lá, ela passa por uma estação de tratamento que
está, segundo ele, desativada. A estação pertence ao município, cujo
prefeito é Jorge de Melo Elias (PTB). O único tratamento é o cloro
colocado pela Secretaria de Saúde da cidade no reservatório de 210 mil
litros, além do hipoclorito que a população recebe (são necessárias duas
gotas do produto para cada litro de água).
Nem todos, porém, recebem o produto ou
são orientados pelos agentes de saúde. É o caso da comunidade do Retiro,
área rural de Iati. Ali, no dia 24 de maio, morreu Ágata Maria de Jesus
Silva, 2 meses. A mãe, Maria Jaqueline, 19 anos, se assusta quando é
procurada pela reportagem. “Falaram que fui eu que matei minha filha.”
Mas o que matou Ágata foi o racismo ambiental. A água usada na casa de
Jaqueline, uma construção simples, de taipa, é fornecida pelo Exército e
guardada em uma cisterna a poucos metros da casa da agricultora. “Ela
estava mamando, mas parou. Comecei a fazer o leite usando a água que
sempre bebemos e nunca tivemos problema.” A menina ficou doente no
domingo. Na terça, passou a noite com diarreia. Foi levada para o
hospital na quarta de manhã. Não havia médico. Foi então, com a mãe, de
ambulância até Garanhuns, onde seria hospitalizada. Morreu no caminho.
Jaqueline, assim como os vizinhos,
recebem com irregularidade a visita de agentes de saúde. Lucilene de
Jesus Silva, 34, diz que a comunidade foi visitada há alguns dias, o que
não acontecia desde outubro de 2012. “Só depois que muita gente aqui
ficou doente é que eles vieram umas duas vezes.” Meire Cristina Barbosa,
37, mora na frente da casa de Jaqueline, também diz não receber visitas
ou hipoclorito dos agentes. Seus cinco filhos ficaram doentes há poucas
semanas, dois deles durante mais de 8 dias. Tiveram sorte: eram maiores
(5 e 9 anos) que várias das crianças que terminam morrendo. A mãe não
deu remédios – não tinha dinheiro para isso – e investiu em chás. “Aqui
nós melhoramos com o tempo mesmo, sabe?”
DUAS GOTAS - Também moradora da área
rural de Iati, Marluce da Silva, 40, recebe o hipoclorito regularmente.
Confessa que passou tempos usando para outros fins, como limpar a casa
(quando ficava sem água sanitária). “Começamos a ficar doentes da
barriga, eu, meu marido e meus três filhos. E não foi só uma vez, foram
várias.” Marluce começou a usar o hipoclorito e os resultados foram
rápidos: há um mês ninguém da sua família apresentou os sintomas da DDA.
“Agora eu falo para o pessoal usar também. Lá no sítio, tem muita gente
ficando doente.”
Fonte/JC